15.1.08

A luta dos trágicos minerais ou vegetais em busca do amor que se escondeu.

Deus, o que fizeram os homens do amor? O amor seguiu as trilhas humanas, em todas suas sucessões de barbáries repulsivas e grotescas. Por quê? Esse ser burro que é o homo sapiens corrói e destrói tudo, mas por que logo o amor? Sou talvez um mineral ou vegetal? Só assim explicaria o fato de eu não ser um humano. Mas sei que não sou o único não humano. Outros, tão minerais e vegetais quanto eu, pensam o que tento agora escrever como refúgio inadequado de dúvida. E minha pergunta é simples: por quê?

Os homens, quando ainda nem eram homens, amavam? Digo, eles sabiam o que era amor? Não, erro: amar não se sabe, se sente. Mas é um pouco utópico e clichê essa história de que amor se sente, não se fala, não é? Mas esse amor utópico e clichê não seria o amor como nos é posto hoje? Sendo assim, sendo esse amor feio apenas o que nos mostram hoje, penso que não seja tão banal falar dele assim: como algo sentível, e não falável. Falarei dele, então, assim: amor como algo sentível e não falável.

Voltando à pergunta: os homens, quando ainda nem eram homens, amavam? Eles eram apenas uma mistura de macaco com qualquer coisa de divino [ou devo dizer diabólico], mas amavam? Eles não sabiam ainda, claro, o que era amor ou coisa que o valha, mas sentiam? Eu creio que sim, creio que o amor sempre tenha existido. Mas é que as circunstâncias atuais me fazem perguntar à algo sobrenatural essa pergunta que até mesmo um verme responderia.

Acho que os homens amavam o amor, livre como só o amor pode ser. Pois veja: uma árvore sempre estará presa por sua raiz; um pássaro, por mais que não esteja numa gaiola, estará sempre preso ao seu limite de asas; até as nuvens que deslizam no céu parecem sempre estar presas pelo azul do céu; o homem, que tanto prende, estará sempre preso ao seu orgulho; e até mesmo você, deus, está preso pela mente humana que te criou. Mas o amor, o amor que eu penso existir, é livre. É a única coisa que não se condiciona a nada. Ele não tem forma, não tem cor, não tem cheiro, não tem pêlos, não tem asas, não tem nada, nem limites. Sendo assim, o amor é tudo, e sendo tudo ele pode ser livre, pois nada está sobre ele, nem mesmo você, deus, que até a ele se curva. Não, melhor, você lhe dá as mãos, e juntos passeiam num campo bonito onde não existem homens com seus orgulhos. E era esse amor tão supremo e livre que os homens amavam. Mas vou lhe pôr os fatos e assim talvez você responda minha pergunta.

Como disse, os homens amavam esse amor, ainda quando nem homens eram. Eles sentiam isso e compartilhavam isso, pois nada era de nada, e tudo era de tudo. E o mundo é regido por leis simples e práticas: se tudo é de tudo, o amor é de tudo. O amor era de e para tudo, todos. O amor compartilhado e unificado. Mas começa agora a saga humana em destruição ao amor...

Os homens passaram a “evoluir” (e que nome ridículo para dizer que eles passaram a entender que podiam tentar querer ser sempre mais). Lá pelas tantas da história, os homens viviam em pedaços gigantescos de terra desigualmente divididos. Nessa parte da tragédia humana, eles já haviam descoberto que poderiam tentar um se sobrepor ao outro. Foi daí que surgiu o que se pode dizer da maior desgraça humana sobre o Planeta Nada. Por diversos motivos, o homem inventou a “propriedade privada”. Em resumo: isso foi uma desculpa para o homem justificar de forma simples e rápida que o que ele quisesse era dele, desde que outro não tivesse chegado antes e usado a mesma desculpa.

Foi em meio a isso que surgiu o sistema econômico dos círculos de metal. Daí pra frente foi só desgraça atrás de desgraça. Tentando resumir alguns séculos: o homem passou a acreditar que um círculo de metal valia mais que qualquer coisa: mais que árvores, pássaros, nuvens, homens e até mesmo você, deus.

Nesse contexto, a propriedade privada tornou-se lema indispensável para o homem. Ela justificava todo e qualquer fato do homem querer sempre mais do que pudesse ou precisasse. E você me pergunta: em meio a tudo isso, a todas essas idiotices, o que fizeram do amor? E aí, deus, você chega aonde quero chegar!

Em meio a essas monstruosidades de propriedade privada e pedaços de metal, o homem explodiu com o amor. Veja bem: como disse, o mundo é regido por leis práticas, e nada passou a ser de nada, pois todos os homens passaram a acreditar nessas baboseiras que eles próprios inventaram. E não tendo nada para nada, o amor passou a ser de nada. E assim o amor foi se esconder detrás de alguma colina bem longe e fria, onde ninguém pudesse encontrá-lo.

Porém o homem descobriu que precisava de algo para disfarçar sua mediocridade egoísta e orgulhosa, então se lembrou que um dia existiu algo que estava em tudo e para tudo. Nessa carência saudosista ele inventou o amor que nos apresentam hoje. Ele inventou um amor ao seu modo nojento de ser: inferior a círculos de metal e pertencente à sua propriedade privada. Ele tentou fazer do amor a única coisa que era inteiramente livre, sem fronteiras. Ele dogmatizou o amor, colocou numa de suas fábricas movidas a suor, transformou num enlatado e colocou num comercial de horário nobre. O amor, onipotente e lindo, está escondido, dando lugar a essa coisa horrível...

Eu sei de tudo isso, deus, porque os homens me fizeram desacreditar neles. Abdiquei do polegar e da racionalidade para ser um complexo sistema mineral ou vegetal. Sei que minha troca foi recompensadora, pois assim eu pude conhecer a verdadeira história do amor que te contei agora. Sei também que assim como eu há outros. Poucos, mas há!

Então, deus, você que andava de mãos dadas com o amor, me responde: o que fizeram os homens do amor?

Mas revendo tudo que te disse, vejo que respondi todas as minhas perguntas. E assim, me vejo numa dúvida ainda maior: como eu poderia estar atraz de algo que já sabia? A única explicação para mim é a insanidade. Mas não estou louco, é só carência desse amor que se escondeu... Oh, deus, diga-me então, por favor, pois eu preciso achá-lo e me afagar em seu calor, e nele morrer de luz. Onde está o amor?

P.S.: Esse texto é acima de tudo uma esperança do amor.

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